Brasil caminha para se tornar quinto maior produtor de biometano do mundo
- Ecoflex Trading
- 3 de jul.
- 6 min de leitura

A transição energética deu novo fôlego aos biocombustíveis no Brasil, país que já é destaque no uso do etanol na propulsão de motores e da biomassa para geração de eletricidade na indústria. Esse impulso traz novas fontes de receita e oportunidades para o agronegócio nacional.
Uma delas é o biometano, gás renovável equivalente ao gás natural usado em veículos ou na indústria, que pode ser produzido com resíduos da fabricação de açúcar e álcool e da criação de porcos e aves. Ao mesmo tempo, o setor de petróleo e gás coloca as fontes renováveis em seu radar.
Segundo a Associação Brasileira do Biogás (Abiogás), a produção nacional de biometano está pouco acima de 800 mil metros cúbicos por dia, em 12 usinas. Em 2032, deverá chegar a 8 milhões m³/dia. A Agência Nacional do Petróleo (ANP), que aponta uma produção atual menor, de 470 mil m³/dia, estima que, em 2029, o país terá 93 usinas de biometano.
O Brasil caminha para se tornar o quinto maior produtor mundial de gás renovável nos próximos cinco anos, sendo responsável por mais de 10% do fornecimento de biometano no mercado global até 2026, estima a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês).
O movimento é uma oportunidade para o agronegócio porque as principais fontes de produção de biometano são os resíduos da fabricação do sucroenergética e da criação de animais.
Nas contas da Abiogás, o potencial de produção de biometano é de 102 milhões de m³/dia. O valor é cerca do dobro da demanda por gás natural no país, segundo a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás).
Do total desse potencial, 56% vêm da produção de açúcar e etanol e 38% vêm da pecuária. O restante está no aproveitamento do lixo urbano, que hoje é a principal fonte das 12 usinas de biometano em operação no país.
Nos aterros sanitários, o biogás gerado na decomposição dos resíduos é processado na usina para sair como biometano. No caso da agroindústria, o biogás vem da decomposição da vinhaça, resíduo das usinas de cana, ou do esterco de animais criados em confinamento, principalmente suínos e aves.
“Apostar no biometano é apostar no futuro do país. O biometano possui a mesma composição do gás natural, o que permite sua substituição direta em aplicações industriais e no setor de transportes. Essa característica técnica, aliada à origem limpa, faz com que o biometano contribua de forma significativa para a redução das emissões de gases de efeito estufa” explica o diretor de negócios em biogás do Grupo Energisa, Luiz Fernando Tomasini.
“Já deixou de ser promessa”
O Grupo Energisa comprou em 2023 uma usina de biometano em Campos Novos (SC) e pretende investir R$ 90 milhões até o fim do ano. “A usina tem papel estratégico, pois está instalada às margens da BR-282, no coração de um dos principais corredores logísticos do estado, conectando o polo agroindustrial exportador do Oeste catarinense aos portos do litoral”, diz Tomasini.
Ele completa: “Pela primeira vez, a região passará a contar com alternativa local ao diesel. A disponibilidade futura de biometano ao longo da rota logística ampliará as condições para que a indústria catarinense avance na descarbonização de operações e fortaleça o uso de combustíveis limpos”.
A distribuidora ES Gás, no Espírito Santo, pertencente ao Grupo Energisa, quer integrar quatro usinas de biometano à rede de distribuição. A empresa assinou seu primeiro contrato para injeção de biometano em rede canalizada, em parceria com a Marca Ambiental. O projeto prevê R$ 70 milhões de investimento na usina e R$ 5 milhões na infraestrutura da distribuidora.
Segundo Tomasini, a aprovação do Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), no ano passado, e a chamada da Petrobras para adquirir o insumo renovável “impulsiona ainda mais esse mercado”.
Para Tiago Santovito, diretor da Abiogás, o biometano já deixou de ser “apenas uma promessa”. “A lei do Combustível do Futuro, recentemente aprovada, vem justamente para acelerar essa transformação, ao estabelecer uma meta de descarbonização obrigatória para os agentes que comercializam gás natural (produtores e importadores), por meio da inserção de biometano”, afirma.
De olho nas oportunidades no agronegócio, a Eren Biogas Brasil está desenvolvendo projetos para tratamento de resíduos orgânicos das indústrias sucroalcooleira e de proteína animal. Segundo o CEO da companhia, Pierre-Emmanuel Moussafir, o grupo planeja investir até R$ 3 bilhões nos próximos sete anos.
“O Brasil é um dos maiores produtores agrícolas do mundo. Portanto, gera volume de resíduos orgânicos considerável”, aponta e segue: “O país precisa investir fortemente na valorização desses resíduos, permitindo, assim, a produção de energia, biometano e biofertilizante, construindo uma verdadeira economia circular que agregue valor a toda a cadeia”.
Valor dos resíduos
Para Moussafir, o biogás tem potencial para se desenvolver do mesmo modo que a indústria do etanol se estruturou por meio de políticas públicas como o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), que completa 50 anos de lançamento este ano. E já atrai o interesse dos investidores.
“Os investidores procuram outros campos de investimento na área de descarbonização, como biogás e biometano. Além disso, as empresas passaram a perceber o valor dos resíduos” afirma.
A Supergasbras iniciou no ano passado um projeto para substituir parte do diesel pelo biometano. Segundo o CEO da companhia, Júlio Cardoso, o projeto começou com caminhões dos segmentos de granel e envasado. “Com os resultados obtidos, iniciamos a expansão do uso do biometano para mais 18 caminhões da frota neste ano e pretendemos alcançar a marca de 58 caminhões até 2026”, relata.
Já a Gás Verde, dona da maior usina do gás renovável da América Latina, instalada no Centro de Tratamento de Resíduos Rio, aterro sanitário em Seropédica que substituiu o lixão de Gramacho, segue seu plano de converter dez termelétricas a biogás em usinas de biometano, todas em aterros sanitários.
A empresa acaba de conseguir dois empréstimos do BNDES, de R$ 131 milhões no total, para obras de uma das usinas e para construir, na unidade de Seropédica, uma linha de produção de CO2 verde, que pode ser usado na fabricação de bebidas gaseificadas.
“A demanda do mercado é maior que a oferta e isso tem impulsionado a expansão de projetos de biometano. Esse mercado é movido pelo compromisso crescente das empresas, especialmente das grandes corporações, em reduzir emissões de forma definitiva e contribuir ativamente para o combate ao aquecimento global”, diz o CEO da Gás Verde, Marcel Jorand.
Empresas tradicionais buscam adaptação
Se a transição energética impulsiona novos negócios, com destaque para os biocombustíveis, também é uma oportunidade para setores estabelecidos apostarem na adaptação à nova realidade dos negócios.
A Copa Energia, engarrafadora e distribuidora de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP, usado nos botijões), das marcas Copagaz e Liquigás, mira no biometano. A companhias não pretende entrar na produção, mas adquiriu em 2024 a CTG, que atua na compressão e no transporte de gás natural. “A CTG já estava se posicionando para o biometano. A ideia é fechar contratos de longo prazo até o fim do ano”, conta o vice-presidente de estratégia e mercado da Copa Energia, Marcos Mesquita.
Em mais um passo, a companhia está investindo na pesquisa e desenvolvimento do Gás Liquefeito Renovável (GLR), equivalente idêntico ao GLP. Nesse caso, o gás renovável é produzido a partir do óleo de soja ou do etanol. Segundo Mesquita, a expectativa é que a pesquisa, em parceria com a UFRJ e a USP, chegue a um produto comercializável por volta de 2029.
Outra empresa que vem anunciando foco em renováveis é a Petrobras. A petroleira estatal separou US$ 16,3 bilhões de seu plano de investimentos de US$ 111 bilhões para o período de 2025 a 2029 para “iniciativas de baixo carbono”.
Segundo o gerente executivo de gestão integrada da transição energética da Petrobras, William Nozaki, em torno de US$ 5 bilhões são dedicados apenas à área de biorrefino, incluindo biodiesel, diesel verde, etanol e SAF, o combustível renovável de aviação. Na fabricação de etanol, a estatal está negociando parcerias com empresas do setor.
“No etanol, estamos dando sequência à prospecção de parcerias. O objetivo da Petrobras é ter uma atuação relevante nesse segmento, em função da lei do Combustível do Futuro e do aumento dos mandatos. Para a agenda de transição energética, o etanol e os biocombustíveis são prioridade”, diz Nozaki.
Conversão de motores
A produção de SAF e de combustíveis renováveis para navegação marítima representa um novo impulso para a produção porque, diferentemente do transporte rodoviário – no qual os motores elétricos a bateria vêm ganhando espaço rapidamente –, aviões e navios de longo curso têm no uso de combustíveis renováveis a saída mais viável para descarbonizar.
A fabricante de motores finlandesa Wärtsila, que produz propulsores para embarcações, vê os biocombustíveis como um dos caminhos possíveis para reduzir as emissões de gases do efeito estufa, embora a flexibilidade seja importante. “O combustível mais viável é o que está disponível. O melhor é o que está mais perto”, afirma o diretor-geral da Wärtsilä no Brasil, Jorge Alcaide.
No país, a companhia finlandesa trabalha na conversão de motores de embarcações para biodiesel e na adaptação de motores de usinas termelétricas para usarem etanol, em vez de óleo combustível. No primeiro caso, a ideia é que o combustível fabricado por produtores de grãos no Centro-Oeste abasteça os empurradores que movimentam as barcaças que levam a soja e o milho pelos rios para serem exportados pelos portos da Região Norte, diz Alcaide.
FONTE: https://www.novacana.com/
Comments