Ideia do hidrogênio como combustível é ser mais sustentável e mais amigável ao meio ambiente. Mas Senado alterou texto para permitir que a produção solte um pouco a mais de carbono na atmosfera, o que é poluente.
Senado aprovou a política que vai possibilitar, no Brasil, a produção de hidrogênio a partir de energia limpa, com baixa emissão de carbono. O texto ainda precisa passar por nova rodada de votação na Câmara antes de virar lei.
No fim da votação, na quarta-feira (3), os senadores decidiram aumentar a quantidade de carbono que poderá ser lançado na atmosfera no processo de fabricação do hidrogênio. Não houve debate no plenário sobre a mudança. O CO2 é poluente, é um dos gases que provocam o efeito estufa.
Serão 7 kg de gás carbônico para cada 1 kg de hidrogênio gerado. Esse patamar vai configurar um produto com “baixa emissão de carbono” e as empresas que o produzirem serão beneficiadas pela lei com incentivos fiscais. A sugestão, do senador Fernando Farias (MDB-AL), foi aceita pelo relator, Otto Alencar (PSD-BA), para contemplar o etanol, ou seja, a conversão desse álcool em hidrogênio.
Nesta terça-feira (9), uma outra proposta sobre o tema, apresentada por Farias, foi aprovada na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da Casa. Ainda terá de passar pelo plenário.
O texto diz que os governos devem priorizar a compra e a locação de veículos movidos a biocombustíveis, como etanol, ou a hidrogênio. Isso valerá para licitações para troca da frota pública de veículos, como ônibus escolares.
Veja perguntas e respostas para entender o debate.
O que é o hidrogênio verde?
O chamado “combustível do futuro” vai servir para substituir combustíveis fósseis para abastecer, por exemplo, aviões, assim como ser fonte de energia de carros elétricos. O hidrogênio também poderá ser usado na fabricação de fertilizantes, produtos de limpeza, na indústria de aço e farmacêutica.
Tanto a forma líquida quanto gasosa do H2 é usada como fonte de energia.
O hidrogênio verde é extraído a partir da eletrólise da água —quando a passagem de uma corrente elétrica separa os dois elementos que compõem a molécula de água — oxigênio e hidrogênio. Se fonte limpas de energia, como solar, hidráulica ou eólica, forem usadas neste processo, o combustível recebe o selo de hidrogênio verde com zero emissão de CO2. As hidrelétricas servirão de “motor” para a eletrólise no Brasil.
Mas há gradações nesta classificação, que dependem da quantidade de carbono emitida no processo. O hidrogênio cinza, produzido a partir de gás natural, provoca emissão de 10 kg de gás carbônico, que contribui para o efeito estufa. Nesse caso, o processo não é através da água, mas sim pela queima do combustível.
Por que o Senado aumentou o potencial poluente?
Os senadores definiram que uma “baixa emissão de carbono” para gerar hidrogênio ficará no patamar de até 7 kg de CO2. A média europeia é em torno de 4 kg de CO2.
Essa decisão do Senado ocorreu para introduzir o etanol como “fonte renovável” de energia no processo de extração do hidrogênio. Hidrelétricas também foram colocadas nesse grupo.
Para Luiz Piauhylino Filho, secretário do Instituto Nacional de Energia Limpa, a escolha dos senadores ocorreu para atender à realidade brasileira, ao mercado interno, até pela facilidade e baixo custo de transporte do etanol, em comparação com o hidrogênio verde. Segundo ele, não há ainda navios com tecnologia para transportar o hidrogênio verde para o exterior. Isso está sendo desenvolvido.
Desta forma, para o Brasil poder exportar essa energia em larga escala, o hidrogênio precisa ser transportado assumindo outras formas, como etanol e amônia- que serve para produzir os fertilizantes. Uma vez transportado, depois o H2 poderá ser retirado e isolado.
Ele afirma que, se as empresas capturarem o gás carbônico, na hora de fabricar o etanol, haverá uma diminuição drástica de emissão de CO2 na cadeia de produção do hidrogênio. Outra possibilidade sustentável é o etanol de segunda geração, produzido a partir de resíduos (biomassa), com o aproveitamento do bagaço da cana, técnica não muito disseminada no Brasil.
“A entrada do etanol é positiva porque no processo você pode capturar o CO2 que vai ser matéria-prima escassa. Com hidrogênio verde e CO2 Biogênico pode-se produzir os seguintes derivados: Amônia [fertilizantes], EMetanol, SAF [combustível de avião] e Ureia”, explicou o secretário.
O que o projeto do Congresso diz?
A proposta concede incentivos fiscais às empresas produtoras, no montante de até R$ 18 bilhões, de 2028 a 2032. Parte dos recursos poderá vir do orçamento do governo, assim como de doações de entidades internacionais e empréstimos de bancos.
O texto também oferece um outro tipo de crédito fiscal se os produtores contribuírem, por exemplo, para adaptação às mudanças climáticas. O benefício será dado a partir da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Neste caso, as empresas terão débitos de impostos federais quitados ou ressarcimento em dinheiro, se o saldo de créditos for superior aos tributos devidos.
hidrogênio verde já existe no Brasil?
Sim. Há projetos-piloto, como estes:
▶️ A Universidade de São Paulo (USP) está desenvolvendo um reformador a vapor que transforma etanol em hidrogênio. Esse equipamento é um container que, no futuro, vai poder ser instalado em postos de abastecimento para alimentar carros elétricos;
▶️ No Porto do Pecém (CE) está sendo testada a produção da amônia líquida, derivada do hidrogênio, que é usada na fabricação dos fertilizantes;
▶️ No Porto de Suape (PE), há produção do EMetanol (H2 e CO2), que poderá ser transportado por navios na forma líquida, e é usado como combustível.
Como ficará a exportação?
Inicialmente, o Brasil só conseguirá exportar os derivados, como a amônia.
A Europa estabelece condições muito rígidas para importar o hidrogênio verde. Os países não aceitam hidrogênio de origem biológica, como o de etanol, para evitar desmatamentos. Isso vai dificultar a entrada do hidrogênio verde brasileiro na Europa.
De acordo com o secretário do Inel, a energia que gera o H2 precisa ser 90% renovável. Se não for, a empresa precisa cumprir condições, como a cadeia de produção ser na mesma região do país, sem deslocamentos; a fonte renovável precisa ter sido construída a menos de três anos- o que prejudica a exportação de hidrogênio a partir das hidrelétricas brasileiras.
Os países europeus querem diversificar o mercado, deixar de ser reféns do petróleo da Rússia e cumprir o Acordo de Paris, que prevê redução drástica da emissão de gases do efeito estufa.
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