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Crescimento do consumo de etanol acelera descarbonização

A demanda global por etanol deve crescer significativamente nos próximos anos. A expansão do mercado será impulsionada por diversos fatores, como a agenda de descarbonização –em especial no setor de transportes– e a busca por segurança energética, com menor dependência da importação de derivados do petróleo.

O cenário descrito está apresentado no resumo do relatório “Ethanol in Global Market Overview 2023-2027”, de agosto do ano passado. Segundo o estudo, as políticas governamentais terão um “papel crucial” de apoio ao crescimento, por oferecerem incentivos à produção e ao consumo do biocombustível.

No Brasil, uma nota técnica da EPE (Empresa de Pesquisa Energética) também projeta um aumento na oferta de etanol. O país sairia dos 31 bilhões de litros em 2022 para até 51 bilhões de litros em 2033. A maior produção poderá ser alcançada em bases “altamente sustentáveis”, de acordo com o MME (Ministério de Minas e Energia).

A última safra (2023/2024) já foi recorde, com aproximadamente 36 bilhões de litros de etanol –30 bilhões a partir da cana-de-açúcar e 6 bilhões provenientes do milho, segundo o MME. Ao cruzar com dados da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia), chega-se a um aumento de 16% em relação à safra anterior.

Ambas as entidades explicam que o crescimento é fruto da maior produtividade, e não da ocupação de novas áreas para plantação. Também esclarecem o fato de que os milharais para produção de etanol são de 2ª safra, ou seja, plantados logo depois de outra colheita, normalmente de soja, na mesma terra.

“Além disso, para fazer o etanol do milho, só usamos o amido. A proteína, a fibra e o óleo vão ser utilizados para ração animal. No caso da cana, todos os anos, é preciso replantar uma parte dos canaviais e, antes desse replantio, se planta alguma oleaginosa, como amendoim, por exemplo”, disse o presidente da Unica, Evandro Gussi.

Coordenadora do GBio (Grupo de Pesquisa em Bioenergia) e pesquisadora do RCGI (Research Centre for Greenhouse Gas Innovation) da USP (Universidade de São Paulo), a professora Suani Coelho afirma que só 1% do território brasileiro é usado para a produção de etanol. Se fosse necessário ampliar, uma alternativa seria aproveitar parte dos milhões de hectares de pastagem degradada.

“O grande fator da sustentabilidade do etanol é não ser proveniente de locais desmatados, porque só a emissão do desmatamento de uma área para a plantação já estragaria todo o balanço de carbono. O próprio RenovaBio (Política Nacional de Biocombustíveis) exige que as usinas mostrem que não há desmatamento no processo produtivo.”

Por causa da origem sustentável, o simples uso do biocombustível à base de cana-de-açúcar ou milho, em substituição à gasolina, contribui para reduzir em até 90% as emissões de CO2, de acordo com a EPA (Environmental Protection Agency), dos EUA.

Para o Ministério de Minas e Energia, o etanol brasileiro é uma das melhores alternativas, tanto em custos quanto em benefícios ambientais, para a descarbonização do setor de transportes.

Biocombustível reduz emissão de CO2


Além do potencial para o futuro, o etanol contribui para a descarbonização brasileira há mais de 20 anos. Desde 2003, ano de lançamento do 1º carro flex no país, o biocombustível já evitou a emissão de 660 milhões de toneladas de GEE (gases de efeito estufa) –quantidade superior a todas as emissões da Coreia do Sul em 2022.

O cálculo é do setor de inteligência da Unica e inclui tanto o etanol anidro, adicionado à gasolina C, quanto o hidratado, vendido nos postos de combustíveis. Ao abastecerem com E100 (etanol hidratado), os condutores brasileiros também economizaram R$ 110 bilhões nos últimos 20 anos, sendo R$ 7 bilhões só em 2023.

Motorista de carro por aplicativo, Marina Alves tem escolhido rodar com o biocombustível, justamente, para economizar. Ela dirige durante 10 horas e percorre cerca de 250 km, diariamente, na região de Brasília (DF). “Nos últimos meses, tem sido muito mais vantajoso abastecer com etanol do que com gasolina”, disse.

Apesar do uso recorrente, ela não sabia dos benefícios socioambientais inerentes à escolha. A fim de conscientizar pessoas com esse perfil e uma parcela cada vez maior da população, a Unica lançou a campanha #VaideEtanol em janeiro deste ano. A ideia é esclarecer dúvidas dos consumidores e incentivar o uso do biocombustível.

“O brasileiro já tem utilizado o etanol há décadas e o considera um grande patrimônio nacional, mas, a partir de uma pesquisa, percebemos que muitos ainda desconhecem parte dos benefícios ambientais, sociais e econômicos que o etanol é capaz de produzir para o carro, o consumidor, o país e o mundo”, afirmou Evandro Gussi.

A campanha é protagonizada pelo humorista Rafael Portugal e veiculada em rádio e televisão. Cerca de 20 influenciadores também participam da divulgação nas redes sociais. No site oficial, uma calculadora mostra quanto CO2 deixa de ser emitido com o uso do etanol e um quiz testa o grau de conhecimento das pessoas sobre o biocombustível.

O engenheiro mecânico mecatrônico Tarcisio Dias explica algumas das vantagens. Segundo ele, o etanol ajuda a manter o motor mais limpo, por ser menos particular em relação aos hidrocarbonetos, como a gasolina. Outro benefício está no maior poder calorífico, o que dá mais potência e torque ao motor.

Sérgio Lima/Poder360 – 18.04.2024De acordo com o engenheiro mecânico Tarcisio Dias, o etanol tem um melhor custo-benefício se o preço do litro for até 70% do valor do litro da gasolina

“A gente também escuta o mito de que é preciso usar 1 tanque de gasolina depois de uns 3 de etanol. Isso não é verdade. Hoje, os carros flex podem rodar com qualquer mistura dos 2 combustíveis ou sempre só com etanol. Por isso, é muito importante manter a atratividade econômica, para que os brasileiros possam escolhê-lo”, disse.

Mobilidade mais verde


Toda a sustentabilidade atrelada ao etanol faz os carros flex nacionais serem mais verdes que os 100% elétricos da Europa. De acordo com especialistas, isso acontece ao usar a metodologia “do poço à roda”, ou seja, ao considerar as emissões do carro em si, mas também aquelas provenientes da energia usada para abastecê-lo.

“Se a energia do carro elétrico vier de uma termelétrica a carvão ou de algum outro combustível fóssil, pode não ter uma emissão local na cidade, mas haverá uma emissão global. A vantagem é muito pouca. Por isso, essa metodologia é a mais adequada quando falamos de efeito estufa”, afirmou Suani Coelho.

Dados da consultoria agrícola Datagro, compartilhados pela professora, evidenciam a lógica. Ao considerar a tecnologia automotiva de 2017, a emissão de um carro a gasolina é de 166g de CO2 por quilômetro. O elétrico com a matriz energética da União Europeia emite 139g. Já o carro flex com etanol brasileiro emite 45g, e um híbrido a etanol emitiria 23gCO2/km.

Sob esse aspecto, o Brasil pode ter um importante avanço. O projeto de lei 528/2020, conhecido como “Combustível do Futuro”, foi enviado ao Congresso Nacional pelo Ministério de Minas e Energia no ano passado. Um substitutivo foi aprovado na Câmara dos Deputados, em março de 2024, e está no Senado Federal para análise.

O texto visa a aumentar a mistura de etanol na gasolina C –de 18% a 27,5%, como é atualmente, para um intervalo de 22% a 35%– e introduzir, justamente, o conceito de análise de ciclo de vida “do poço à roda”, dentre outras propostas. O PL é considerado, pelo próprio governo federal, uma das principais medidas de apoio ao setor de biocombustíveis, assim como:

  • Programa Mover (Mobilidade Verde e Inovação): substitui o Programa Rota 2030, com o objetivo de incentivar a mobilidade sustentável a custos acessíveis; e

  • Reforma tributária: pode assegurar o tratamento tributário diferenciado para biocombustíveis, em função dos benefícios socioambientais associados à produção e ao consumo.

Os dispositivos, especialmente o Combustível do Futuro, têm o potencial de “destravar” R$ 250 bilhões de investimentos até 2037. De acordo com o MME, o valor estaria ligado à implantação de novas tecnologias, como a captura e a estocagem de carbono, favorecendo também empregos em pesquisa e desenvolvimento, por exemplo.

“O esforço para a descarbonização da mobilidade é um dos maiores desafios do século 21 na perspectiva de combate às mudanças climáticas. Nesse esforço, a inequívoca vocação para a produção e o uso de bioenergia no Brasil confere vantagem competitiva e comparativa ao país na liderança mundial em transição energética”, declarou o ministério.

Vantagens sociais e econômicas do etanol

Para avaliar os impactos socioeconômicos de diferentes rotas de descarbonização, o movimento MBCB (Mobilidade de Baixo Carbono para o Brasil) encomendou um estudo à LCA Consultores e à MTempo Capital. Foram contrapostos 2 cenários principais: a convergência global para veículos 100% elétricos e a prevalência de híbridos.

O resultado, divulgado em março de 2024, mostra ampla vantagem ao país na 2ª situação. Seriam criados mais de 1 milhão de novos empregos no setor de transporte e o PIB (Produto Interno Bruto) aumentaria R$ 877 bilhões até 2050. Por outro lado, o predomínio dos elétricos puros poderia acarretar “perdas consideráveis para a economia brasileira”, por causa do menor número de peças e da importação de minérios para a fabricação das baterias.

A aposta em veículos 100% elétricos também demandaria de US$ 210 bilhões a US$ 300 bilhões de investimentos em infraestrutura, de acordo com um estudo da EPE, de 2018. Só depois de esse valor ser investido, o país teria uma rede de abastecimento (smart grid) nos parâmetros da atual, disponível para os carros à combustão.

Enquanto isso, a cadeia sucroenergética do Brasil movimenta um valor bruto superior a US$ 100 bilhões, respondendo por aproximadamente 2% do PIB nacional. Também emprega 2,2 milhões de pessoas, direta e indiretamente, segundo dados da Unica. Além de contribuir com 15,4% da matriz energética –a maior do país dentre as fontes renováveis.

“É sempre importante lembrar que, quando falamos de etanol e biomassa, nós estamos falndo de um setor que tem uma geração de emprego e renda importante, em particular na parte agrícola, que é bastante significativa na economia nacional. Então, além da vantagem ambiental, a gente tem essa vantagem social”, destacou Suani Coelho.

Um ponto socioeconômico destacado, inclusive pelo Ministério de Minas e Energia, diz respeito à localização das usinas de etanol autorizadas pela ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis). Estão espalhadas por 20 Estados, ou seja, colaboram para a descentralização de emprego, renda e desenvolvimento.

O estudo “Accelerated growth of the sugarcane, sugar, and ethanol sectors in Brazil”, de 2016, de professores da USP e da UEL (Universidade Estadual de Londrina), dimensionou o impacto econômico de uma usina de etanol e açúcar. No ano de instalação, o PIB per capita aumentou US$ 1.098 no município sede e US$ 458 nos 15 mais próximos.


Alternativa para o futuro verde



Diante dos impactos ambientais e socioeconômicos, especialistas defendem o híbrido flex –sistema automotivo que combina 2 motores, 1 elétrico e 1 à combustão. Este só começa a funcionar quando o automóvel identifica um baixo nível de carga na bateria. Nesse caso, o motor flex é ligado, automaticamente, para produzir energia e recarregá-la.

De acordo com o engenheiro mecânico Tarcisio Dias, essa alternativa soluciona outro gargalo dos veículos totalmente elétricos: a autonomia. Suficiente para o uso urbano, costuma deixar o motorista “na mão” em viagens mais longas, acima de 300 km ou 400 km. O preço mais elevado também é outro obstáculo, no acesso.

“O híbrido flex é o melhor dos 2 mundos, porque tem emissão zero no dia a dia, e uma baixa emissão de carbono nos demais momentos, ao usar etanol. A partir de agora, em 2024 e 2025, uma quantidade maior de veículos vai chegar ao mercado com essa tecnologia, e a gente espera que o cliente opte por esse tipo de solução”, disse.

A experiência consolidada em relação à produção de biocombustíveis e ao desenvolvimento da tecnologia flex pode levar o Brasil a uma posição de liderança na transição energética mundial, especialmente no Sul Global. A agenda também deve aproveitar o engajamento atual e ser potencializada enquanto o país estiver na presidência do G20.

“A grande vantagem brasileira é que nós aprendemos a fazer, nessas últimas décadas, bioenergia com sustentabilidade. E por que isso é importante? Porque o etanol vai ter um papel muito relevante nas próximas décadas, 1º para a mobilidade terrestre e, depois, para a aviação (SAF) e o transporte marítimo”, afirmou Evandro Gussi.

Nessa trajetória, o Brasil participou –junto a Estados Unidos (maior produtor mundial de etanol), Índia e outros 16 países– da concepção da Aliança Global para os Biocombustíveis, lançada em setembro do ano passado. O objetivo é compartilhar o know-how no setor e acelerar a replicação em países asiáticos, latinos e africanos.

“Nós nos unimos porque o Sul Global tem uma grande vantagem competitiva com a produção e o uso de biocombustíveis. Juntos, podemos garantir geração de emprego e renda, menor preço ao consumidor e diminuição da pegada de carbono. Oferecemos ao mundo uma proposta concreta e imediata de descarbonização do setor de transporte”, afirmou o Ministério de Minas e Energia.



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