Especialistas apontam que apenas o ICMS congelado não vai diminuir o preço do combustível

Governadores decidiram acabar com o congelamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis, que está em vigor desde 1º de novembro de 2021. Com isso, a partir do primeiro dia de fevereiro, o valor do imposto voltará a mudar de acordo com o preço final pago pelos motoristas nos postos.
Dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) mostram que a medida não baixou o preço de forma significativa para os motoristas. No caso do diesel, houve até aumento. Segundo especialistas, a decisão apenas evitou que os valores subissem ainda mais.
O que mostram os dados
O congelamento do ICMS foi anunciado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) no dia 29 de outubro.
Para a gasolina, o preço médio na semana anterior ao congelamento (de 24 a 30 de outubro) era de R$ 6,75, segundo a ANP. Entre 31 de outubro e 6 de novembro, período que cobriu os primeiros dias da medida, a média foi de R$ 6,91. Os valores foram corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Na semana do dia 9 de janeiro (o dado mais recente), o preço médio registrado foi menor, de R$ 6,61.
Para o diesel, houve alta de R$ 0,06: o preço médio foi de R$ 5,36 no final de outubro para R$ 5,42 em janeiro.

Reajustes da Petrobras
Especialistas dizem que o valor do ICMS sobre combustíveis é alto, considerando que eles são produtos essenciais. Para a gasolina, por exemplo, as alíquotas (o percentual cobrado sobre o preço) variam de 25% a 34%, dependendo do estado.
Segundo detalhamento da Petrobras, considerando o preço da última semana de dezembro, o imposto respondia por R$ 1,77 dos R$ 6,63 cobrados, em média, por um litro de gasolina (26,7%).
As alíquotas do ICMS são aplicadas sobre o Preço Médio Ponderado ao Consumidor Final (PMPF), uma média resultante de pesquisas feitas pelos governos nos postos de combustível. O que estava congelado era o PMPF, ou seja, a base de cálculo do imposto.
De acordo com os analistas, a questão é que, mesmo alto, o ICMS não é o principal componente do aumento dos combustíveis: o que mais pesa são os reajustes da Petrobras nas refinarias.
O detalhamento da própria empresa mostra que o valor repassado à Petrobras responde por 34% do preço médio do litro da gasolina (R$ 2,26). No caso do diesel, a fatia é ainda maior, de R$ 3,02, ou 56% dos R$ 5,41 cobrados por litro, em média, na última semana do ano passado.
A origem dos aumentos está na política de preços adotada pela Petrobras. Desde 2016, a empresa vincula o valor dos combustíveis no mercado internacional à cotação do petróleo no exterior, em dólar. Com dólar e petróleo altos, houve impacto nos valores praticados pela empresa.
Desde o congelamento do ICMS, a Petrobras realizou dois reajustes dos preços cobrados nas refinarias. Em dezembro, a empresa diminuiu o preço da gasolina em 3,1%. Mas, na semana passada, o movimento foi o contrário: a gasolina subiu 4,85%; e o diesel, 8,08%.
Medida isolada não resolve, diz especialista
Por causa de tudo isso, segundo Rodrigo Leão, coordenador técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), ligado à Federação Única dos Petroleiros, já era esperado que o congelamento do ICMS tivesse pouco impacto sobre o preço final dos combustíveis.
“O problema do combustível é estrutural e não será resolvido com uma só medida. [O congelamento do ICMS] é uma tentativa de evitar o aumento de alguns centavos. Há outros elementos que continuam puxando o preço para cima”, disse.
O professor Marcelo Simas, do MBA de Economia do Petróleo e Gás da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que os preços ficaram estáveis enquanto não houve aumento da Petrobras. “Agora que houve um novo aumento, o preço para o consumidor vai subir também, o que mostra que a questão não é só o ICMS”, afirma.
Simas aponta que, se durasse por mais tempo, o congelamento poderia ter o efeito inverso. Se o preço diminuísse, por exemplo, o imposto não cairia da mesma forma – o que aponta para a necessidade de outras medidas para diminuir o preço para o consumidor.
Especialistas sugerem outras possibilidades, como a criação de um fundo de estabilização do preço ou a aplicação de um imposto variável, que aumentaria ou diminuiria dependendo do valor final.
Politização do tema
O presidente Jair Bolsonaro (PL) vem atribuindo a alta no preço dos combustíveis aos governadores. Nesta semana, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), também criticou governadores, afirmando que os estados resistem em reduzir o ICMS. O imposto é a principal fonte de arrecadação dos governos estaduais.
Para Leão, há uma politização do debate. “O governo escolheu responsabilizar os governos estaduais. Como não pôde comprar briga com Petrobras, que é acionista, empresários que são sua base de liderança, e seus ministérios, a estratégia adotada foi de colocar o ônus nos governadores”, avalia.
O diretor institucional do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda Estaduais (Comsefaz), André Horta, afirma que os governos estaduais fizeram sua parte. No entanto, reforça o coro que apenas o ICMS não vai tornar o combustível mais em conta para o consumidor.
“[Por não discutir o tema,] o governo beneficia uma minoria de acionistas da Petrobras e prejudica uma maioria. A população perde porque o preço do combustível continua subindo”, afirma.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), demonstrou na segunda-feira, 17, interesse em discutir o congelamento do combustível. O Comsefaz é contrário porque acredita que a arrecadação pode sofrer uma perda bilionária para estados e municípios.
Giulia Fontes e Henrique Santiago
Fonte: www.novacana.com
Comments